Avalanches de acusações em véspera de eleição são próprias do jogo político. Desvios de conduta vêm à luz com mais força, pequenos deslizes ignorados em tempo de paz ampliam-se sob a objetiva da campanha. É na luta dos contrários que se depura a representação política e se aperfeiçoam as instituições. Essa é a natureza da democracia. Mas é também no calor do debate que se vende o caos e generaliza-se a denúncia.
As tribulações por que passa o Congresso Nacional, neste ano pré-eleitoral, são exemplares. Não fosse o jogo político e véspera de eleição, muito do que jazia na sombra jamais viria à luz. E é por isso que a pior democracia é preferível à melhor das ditaduras, nas quais impera o silêncio e o político não tem voz.
Por pior que o político nos pareça, é no Parlamento e por meio de outras instituições, como a imprensa, que se lava a roupa suja do poder. É também no Congresso que ecoam e se amplificam todas as mazelas da vida nacional. Como alerta o presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro César Asfor Rocha, no Cartas a um jovem juiz, seu livro oportunamente recém-lançado, “os políticos e os partidos são tão necessários à vida social quanto os magistrados, os administradores públicos (...). Isso é a política, que não se pode ignorar e da qual ninguém pode fugir”.
Queiramos ou não, o Parlamento é a janela pela qual o cidadão enxerga o poder. O político, por definição, é um dos olhos do povo. E por pior que pareça, é a sua voz, que traduzirá tão bem a vontade dos representados quanto melhor for a qualidade do voto.
O perigo está em nivelar desiguais, como ensina brilhantemente Asfor Rocha aos jovens juízes. Porque desmerecer a todos “é semear desesperança”. Desqualificar o Parlamento, mais que tudo, é abrir mão da cidadania. Assim como desmerecer a magistratura é abrir a porta para o despotismo.
A teoria clássica da separação dos poderes, formulada por Montesquieu, é a garantia de um governo moderado. Enfraquecer o Parlamento, pelo desprezo indiscriminado ao político, é permitir o avanço de um poder sobre outro. É abrir mão da função fiscalizadora dos representantes do povo sobre o aparelho de Estado.
Por mais que o teatro político em certos momentos desagrade, sem ele o cidadão não será considerado nem respeitado; só terá lugar na plateia.