Com certeza o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, quando propôs a seus pares que fosse colocada na internet a relação de processos cujos julgamentos estão paralisados por pedidos de vista, tinha dois objetivos em mente: o primeiro teria sido buscar maior celeridade nas decisões, visto que a crônica morosidade na prestação da tutela jurisdicional, que tem levado a situações profundamente injustas - pois Justiça que tarda é Justiça que falha -, é a queixa básica da sociedade em relação a esse essencial Poder de Estado. Se a mais alta Corte de Justiça é emperrada em seus trâmites, certamente todo o sistema judiciário o será.
O segundo motivo - que também diz respeito ao prestígio da Justiça - é o da necessidade de sua transparência. De há muito se fala em "caixa-preta" do Judiciário, como se este fosse integrado por um grupo de iniciados cheios de segredos indecifráveis para o comum dos cidadãos. A criação da TV Justiça, pela qual os julgamentos do Supremo são transmitidos para a população - afora as matérias e debates sobre temas relacionados aos procedimentos judiciais -, já significou um avanço no caminho da transparência da Justiça. Sem dúvida, o uso da internet para esclarecer a opinião pública sobre as razões dos atrasos no andamento dos processos - e o pedido de vista é um fator preponderante de procrastinação - seria mais um grande avanço no rumo salutar dessa transparência.
Há uma outra razão, porém, para que a ideia de Gilmar Mendes seja de grande oportunidade: a Lei nº 11.280, sancionada em 16 de fevereiro de 2006 - portanto, há três anos -, determina que o juiz que pedir vista do processo terá de trazê-lo de volta para julgamento da turma em no máximo dez dias. Caso o processo não seja devolvido nem for solicitada a prorrogação do prazo pelo juiz, o presidente da turma ou câmara de julgamento deve requisitar a ação e reabrir o julgamento automaticamente, na sessão seguinte. Indaguemos agora: os ministros do Supremo estarão obedecendo a este dispositivo legal?
Geralmente os casos polêmicos acabam sendo paralisados por pedidos de vista, sob a alegação, dos ministros, de que precisam refletir melhor sobre a questão. Isso ocorreu por ocasião do julgamento sobre o aproveitamento das células-tronco embrionárias e na questão, ainda sub judice, da definição do futuro da reserva indígena Raposa Serra do Sol. O fato é que a proposta do presidente do STF facilitaria o controle - por parte da opinião pública - dos pedidos de vista naquela Corte, mas criaria um certo constrangimento aos ministros que pedem vista e demoram meses para devolver o processo para que o julgamento tenha prosseguimento. Ressalve-se apenas a hipótese de a procrastinação poder dever-se à demora da reentrada do processo em pauta, mesmo que o juiz que pediu vista já o tenha devolvido em tempo.
Infelizmente os outros ministros do Supremo não acataram a sugestão do presidente da Casa. Assim, continuará difícil para a população entender, mesmo sabendo que determinadas questões são por demais complexas e exigem maior tempo de estudo e reflexão - como as duas aqui mencionadas -, como uma única pessoa, com todas as qualificações que possua um magistrado da mais alta Corte de Justiça do País, possa atrasar indefinidamente o desfecho de um processo judicial, do qual às vezes depende a sorte de uma pessoa, de uma família ou de uma empresa.
Não há como deixar de entender que a condição de "dar a cada um o que é seu", na qual se fundamenta a tutela jurisdicional do Estado, é indissociável da tempestividade com que se efetiva a decisão judicial. Uma sentença demasiadamente demorada, mesmo se calcada em princípios e fundamentos absolutamente corretos, terá poucas condições de ser, realmente, justa. Nisso o exemplo mais dramático - e às vezes trágico - é o que costuma ocorrer com os chamados precatórios, em que a Justiça dá ganho de causa a pessoas que esperaram uma sentença favorável a vida inteira, mas não estão mais vivas quando lhes chega o momento da vitória judicial: não há mais a quem a Justiça "dar o que é seu".